terça-feira, 19 de agosto de 2014

Comissão de Educação do Senado busca consenso sobre normas ortográficas

     A Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) vem aprofundando o debate nacional a respeito do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Professores e linguistas consultados e atendidos pela comissão têm usado o espaço para trocar opiniões a respeito da data oficial de implantação definitiva do acordo e de possíveis alterações em seu conteúdo.

     Os debates são realizados no âmbito de um Grupo de Trabalho Técnico (GTT) montado pela comissão, que reúne o Centro de Estudos Linguísticos da Língua Portuguesa (Cellp), a Academia de Letras de Brasília (ALB) e o movimento Simplificando a Ortografia. Além dessas instituições, a Associação Brasileira de Linguística (Abralin) procurou a comissão para apresentar sua posição.

     Os encontros do GTT são internos e fechados ao público. Portanto, a CE não pode divulgar suas datas ou quem participa de cada um deles. No entanto, a comissão planeja trazer à tona os temas debatidos ao longo dos últimos meses em uma audiência pública, prevista para outubro. Atualmente não há nenhuma proposição formalizada na comissão a respeito do assunto.

     O presidente da CE, Cyro Miranda (PSDB-GO), acredita que um debate abrangente a respeito do acordo ortográfico é urgente.

     – Tínhamos um acordo que não era acordo. A reforma foi feita sem ouvir ninguém. A comissão resolveu botar ordem na casa e tomamos a medida de convocar o debate – disse ele.

     O senador rejeita a possibilidade de promover mudanças profundas nos termos do acordo, mas ainda não vê uma solução definitiva próxima.

     – Não queremos fazer uma reforma geral da ortografia. Queremos fazer o mínimo possível de mudanças, mas chegar a um consenso entre os países. Ainda estamos longe disso. As autoridades competentes têm que se envolver mais. Só a comissão se movimenta – afirma Cyro.

     O senador citou ministérios e a Academia Brasileira de Letras (ABL) como instituições que deveriam participar mais dos debates.

Resistência

     A senadora Ana Amélia (PP-RS), integrante da CE, foi autora de um requerimento que pedia a prorrogação da fase de transição entre as normas tradicionais e as alterações promovidas pelo acordo. No entanto, apenas um decreto presidencial poderia promover essa mudança.

     – Levei essa demanda à Casa Civil e observei que seria oportuno, inclusive em solidariedade a Portugal, que vivia um momento de crise econômica e teria dificuldades de conduzir a implementação – lembra.

     O resultado foi o Decreto nº 7.875, de dezembro de 2012, que transferiu a data-limite para adoção total do acordo de 2013 para 2016.

     Ana Amélia defende a iniciativa da comissão de promover encontros entre especialistas para debater o acordo.

     – Havia resistências bastante sensíveis ao acordo. Os professores, que são os difusores da língua, reclamavam que não haviam sido consultados – diz.

     São esses profissionais, disse a senadora, que conduzirão o processo.

     – Fizemos nosso papel de abrir o debate, e estou satisfeita com isso. Não vamos interferir em conteúdo. Quem vai abordar isso são as pessoas que vivem da escrita: professores, acadêmicos, escritores, editores, jornalistas – explica.

     Ela também destaca a importância de integrar os demais países lusófonos ao debate.

     – Portugal sentiu que teve pouco protagonismo, e é o berço da nossa língua. Nem todos os países haviam ratificado o documento. O Brasil não pode impor um acordo, tem que respeitar seus parceiros – afirma a senadora.

     Ana Amélia relata ainda que deputados portugueses elogiaram a atitude da comissão, sentindo-se contemplados pelas novas discussões em torno do acordo ortográfico.


Acordo ortográfico será discutido em audiências públicas

     O professor Ernani Pimentel, idealizador do projeto Simplificando a Ortografia, é um dos coordenadores do grupo de trabalho criado na Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) para discutir o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Ele pretende ampliar a discussão sobre a Língua Portuguesa e levar além do estágio atual as transformações no idioma. Segundo sua avaliação, o acordo ortográfico precisa ser repensado.

     - O acordo foi concebido em 1970, assinado em 1990 e promulgado em 2008. Já nasceu defasado - analisa ele.

     O objetivo final do ciclo de debates, explica o professor, é levar propostas a respeito do acordo para exposição no Seminário Internacional Linguístico-Ortográfico da Língua Portuguesa, que será realizado em Brasília no mês de setembro. No evento, as melhores ideias serão selecionadas pelos participantes, que são especialistas e profissionais da Língua Portuguesa. Depois disso, audiências públicas amplificariam o assunto.

     Na visão de Pimentel, o que está em jogo é o próprio ensino da língua.

     - O acordo mantém regras que estão dissociadas da didática moderna. É tão cheio de incoerências que nenhum professor em sã consciência pode dizer que o entende completamente - critica.

     Sua intenção, expressa no nome de seu projeto, é simplificar normas ortográficas. Ele acredita que muitas são mantidas por motivos que não fariam mais sentido.

     - A grafia de certas palavras só tem explicação pela etimologia. Mas ninguém se preocupa mais em saber a origem das palavras. Então temos regras inaplicáveis, que não são práticas. Podemos eliminar algumas delas e facilitar o aprendizado.

     Por outro lado, o linguista Carlos Alberto Faraco, da Associação Brasileira de Linguística (Abralin), acredita que o país já está bem organizado em torno da proposta original do acordo e não vê razão para que se reabra a discussão da ortografia.

     - No momento, é absolutamente prioritário o fechamento do círculo do acordo, que veio não para reformar a ortografia, mas apenas para dissolver a dualidade de ortografias oficiais que estavam criando constrangimentos à internacionalização da nossa língua - opina ele.

     Faraco acredita que o Brasil já está pronto para adotar definitivamente as normas do acordo ortográfico de forma exclusiva, o que só está previsto para acontecer em 2016. Atualmente, vive-se uma fase de transição, em que tanto as regras antigas quanto as novas devem ser aceitas como corretas.

     - A partir de 2010, todos os milhões de livros do Programa Nacional do Livro Didático estão sendo publicados em conformidade com o acordo ortográfico. O sistema escolar o incorporou sem qualquer trauma. Os documentos oficiais estão ajustados. Toda a imprensa brasileira e todas as editoras o adotaram. Em suma, o acordo já está inteiramente implantado no Brasil de fato - acredita o linguista.

Fonte: Agência Senado

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